sexta-feira, 11 de janeiro de 2013

111. Narrativas de florestas e cidades amazônicas: patrimônios, histórias e literaturas em trânsitos orais, escritos e visuais

Coordenador: FRANCISCO BENTO DA SILVA (Doutor(a) - UFAC)


Resumo: A proposta deste Simpósio Temático tem como foco discutir os múltiplos aspectos relacionados aos patrimônios, histórias e literaturas das Amazônias e Pan-Amazônia. No entrecruzamento cultura-natureza/natureza-cultura estão pontuados os eixos articuladores da perspectiva que norteia essa proposta de ambiente de reflexões. Neste sentido, busca-se congregar os mais diversos discursos, escritas, abordagens e áreas do conhecimento em que seus atores e autores transitam, dialogam e tecem impressões a partir de suas específicas abordagens. As dimensões espaciais em foco devem transitar pelos diferentes aspectos do urbano e do rural, de cidades e florestas, da cultura e da natureza, das mobilidades e suas permanências, imaginários e “realidades”, que devem ser pensados em suas fronteiras fluidas e em permanentes diálogos, conflitos, usos, desusos, heranças e incorporações. Desse modo, intenta-se aproximar tanto as universidades e pesquisadores de distintos territórios amazônicos, quanto outras vozes externas a eles, pautadas pelas questões do tempo presente para, entre as persistentes criações, recriações e incorporações vividas pelo patrimônio material e imaterial das populações de tradições orais, rurais e ribeirinhas amazônicas, pontuar estratégias de valorização de estudos e publicações articuladoras dos saberes e vozes de distintos sujeitos sociais, tradicionalmente silenciados no âmbito de uma historiografia de caráter amazonialista.

Justificativa: A escrita do conhecimento acerca de patrimônios, histórias e literaturas gestadas no ventre de culturas Amazônicas e Pan-Amazônicas pode ganhar consistentes fios em trabalhos acadêmicos, cujo foco versa por diálogos com documentos orais, escritos e visuais. Situadas em tempos e contextos a agregar temporalidades e espacialidades, tradições e modernidades, localidades e globalidades, essas linguagens permitem leituras capazes de adentrar variados ambientes, onde populações locais ou em deslocamentos inscrevem, em seus enfretamentos cotidianos, todo um modo de vida e de luta, representados em patrimônios materiais, imateriais, afetivos, práticas de trabalho, religiosidades, sociabilidades que exigem e forjam a construção de projetos sociais alternativos para defender suas existências.
Em relações quase sempre desiguais, grupos nativos e diaspóricos, misturando-se em diferentes tempos e espaços nas florestas e cidades das muitas Amazônias, desde há muito, encontram-se e se confrontam com epistemologias eurocentradas, defendendo, em meio às tensões e conflitos presentes nos contatos e intercâmbios culturais, interesses e necessidades orientadas por cosmologias esquadrinhadas em seus universos culturais.
Os diálogos e estudos de diferentes pesquisadores dos mundos amazônicos vêm procurando colocar em evidência práticas culturais e modos de vida gestados em condições peculiares de relação cultura-natureza. A partir desses estudos procuramos definir as noções de patrimônios, histórias e literaturas que tematizam este simpósio.
Patrimônios porque parte da noção própria daquilo que é essencial para a compreensão das culturas amazônicas, a partir das quais homem e “mundo natural” (THOMAS, 2010) se misturam por entre rios, cidades, florestas, serras, vales e as altitudes andinas culturalizando-se ou naturalizando-se na produção de saberes e viveres, crenças, línguas e tudo o que faz parte da produção de humanidades, na perspectiva do tangível e do intangível.
Histórias porque tecidas secularmente num mundo marcado pelo tempo da grafia e da pena do colonizador (CERTEAU, 1982) que traduz e é traduzida pelo corpo do colonizado (PRATT, 1999). Mas também por temporalidades geológicas e naturais que produzem outras perspectivas a constituir o ritmo da vida, produzido performances, percussões, oralidades impossíveis de serem traduzidas pelas letras brancas.
Literaturas porque tempo e espaço não perduram à margem de narrativas (RICOEUR, 2011), mas entranhadas como dimensão ontológica de sua própria existência. Para além dessa percepção porque ficção e história se articulam como parte da própria “invenção” (GONDIM, 1994) de uma Amazônia singularizada e a-histórica, impregnada de sedentarismo, que é cotidianamente desafiada pela errância (GLISSANT, 2005) de “corpos inabitáveis” (VILELA, 2001), pelas falas do intraduzível que somente ganha sentido como parte dos símbolos, desenhos, gestos, cores, odores, saberes, sabores e espiritualidades que se deslocam incessantemente não somente pelas diásporas (HALL, 2003) oriundas dos contatos étnicos, linguísticos e culturais, mas da própria condição de ser, viver e produzir os espaços e tempos amazônicos e pan-amazônicos.
Nessa direção, a relevância deste Simpósio consiste na premissa dele estar norteado pelo princípio de correlacionar práticas investigativas em torno de dinâmicas de vida em florestas e cidades amazônicas, pontuando suas semelhanças e diferenças, com o compromisso político e a responsabilidade social na defesa do direito à vida, à história, à memória, ao patrimônio e à cidadania das gentes que vivem nas Amazônias. Constitui-se, portanto, em mais um espaço de afirmação do caráter indissociável entre teoria e prática, academia e sociedade, razão pela qual pesquisadores envolvidos com temáticas do plural e complexo mundo amazônico estão convidados a filiarem-se a este movimento de diálogo, socialização e reflexão de escritas sobre diferentes formas de patrimônios, histórias e literatura

Bibliografia:

CERTEAU, M. A escrita da história. Rio de Janeiro: Forense-Universitária, 1982

GLISSANT, E. Introdução à uma poética da diversidade. Juiz de Fora: UFJF, 2005.

GONDIM, N. A invenção da Amazônia. São Paulo: Marco Zero, 1994.

HALL, S. Da diáspora: Identidades e mediações culturais. Belo Horizonte: Editora UFMG, 2003.

HEMMING, J. Fronteira amazônica: a derrota dos Índios brasileiros. Tradução de Antônio de Pádua Danese. São Paulo: Edusp, 2009.

LEONARDI, V. P. B. Entre árvores e esquecimentos: história social nos sertões do Brasil. Brasília: Paralelo 15, 1996.

LIMA, N. T. Um sertão chamado Brasil: intelectuais e a representação geográfica da identidade nacional. Rio de Janeiro: Revan/IUPERJ, 1999.

PACHECO, A. S. E o negro vestiu o índio... Intercâmbios afroindígenas pela Amazônia marajoara. São Paulo: Anais do Simpósio Nacional da Anpuh, 2011.

PRATT, M. L. Os olhos do império: relatos de viagem e transculturação. Tradução de Jézio Hernani Bonfim Gutierre. Bauru: Edusc, 1999.

RICOUER, P. Tempo e narrativa. Tradução de Claudia Berliner e Márcia Valéria Martinez de Aguiar. Editora WMF Martins Fontes, 2011.

SAID, E. W. Cultura e imperialismo. Tradução: Denise Bottman. São Paulo: Cia das Letras, 1995.

SARLO, B. Tempo passado: cultura da memória e guinada subjetiva. Tradução: Rosa Freire D’Aguiar. São Paulo: Cia das Letras; Belo Horizonte: Editora da UFMG, 2007.

SUSSEKIND, F. O Brasil não é longe daqui: o narrador, a viagem. São Paulo. Companhia das Letras, 1990.

THOMAS, K. O homem e o mundo natural: mudanças de atitudes em relação às plantas e aos animais (1500-1900). São Paulo: Companhia das Letras, 2010.

UGARTE, A. S. Sertões de bárbaros: o mundo natural e as sociedades indígenas na Amazônia na visão dos cronistas ibéricos – séculos XVI/XVII. Manaus: Valer, 2009.

VILELA, E. “Corpos inabitáveis. Errância, filosofia e memória”, In: LARROSA, J. & SKLIAR (Orgs.). Habitantes de Babel: políticas e poéticas da diferença. Belo Horizonte: Autêntica, 2001.

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